Fechou o zíper da mala, após tê-la aberto pela quinta vez. Não sabia para quê tanta cautela, eram só dois meses. Dois meses fora da sua zona de conforto. Enquanto arrastava as malas em direção a porta, pensava no que a fizera ir. Estava tudo constantemente nublado, sem nesgas de sol. E cansara de tentar, desesperadamente, que gostassem dela, de fazer as coisas darem certo. Quando alcançou o térreo, depois de quinze andares no elevador, colocou os óculos escuros. Arrastou as malas pra dentro de um táxi relativamente decrépito, que a levaria rumo ao seu novo destino. Tentou não pensar em nada enquanto a paisagem lá fora corria pelo seus olhos, mas era inevitável. Lá estava o café que ela não quis ir com o ex namorado. E por ali, o shopping de tantos almoços. Em uma esquina, um açaí, palco de confissões e encontros após as aulas de inglês que ela não frequentava mais. Muitos prédios e casas conhecidos, lugares de visitas agradáveis e desagradáveis. Passou pelo colégio que estudou a vida toda, e não conseguia decidir se dizia obrigada ou cuspia na calçada de lá. Alguns bares passageiros, algumas casas de show, todas muito presentes na sua adolescência. Mas estava cansada de ser a adolescente incompreendida, perdida, que pedia constantemente por perdão por algo que não havia feito, que caía e sempre precisava de uma mão para levantá-la. Não queria mais ser aquela pessoa que era encontrada chorando trancada em um reservado no banheiro da escola. Precisava arejar. Abriu a janela do banco de trás do táxi, o máximo que pôde. Parecia que antes de ir embora, ele a estava levando para ver tudo que ia perder, e tudo que já estava perdido, acabado, enterrado, bom ou ruim. Passou pelos lugares que beijou meninos. E que beijou meninas. Pelas casas de festas que conheceu pessoas, pelas ruas que andou ao longo dos anos, em busca de algum sentido, em busca dela mesma. Quem sabe novas ruas não precisassem ser percorridas no lugar que ela estava indo? Quem sabe novas batalhas em busca de si não precisassem ser travadas? Quando finalmente chegou no aeroporto, e fez o check-in, não havia dúvidas: era isso que queria, era assim que ia ser. E por que não fazer disso uma decisão permanente? O bom do permanente é que nunca é imutável. Ao entrar no avião, e ouvir as instruções de segurança pela milhonésima vez, sorriu consigo mesma ao ver uma nova perspectiva. Tudo que havia de ser esquecido, seria. E tudo que havia de ficar no coração, ficaria. Só ele, que nem te nota, que você não faz ideia de onde colocar. Enquanto o avião subia, uma conhecida música entoava na sua cabeça: "tristeza não tem fim, felicidade sim".
Eu sobrevivo, eu sobrevivo! Polônia. Tempos difíceis, todas as pessoas consideradas indesejadas estavam indo embora para terras quentes, infestadas com o odor da novidade, do fervor da fuga. A saída sorrateira do país desencontrava amores, despistava amantes. Numa casa, não muito longe do centro de Varsóvia, uma mulher suspirava. Lia e relia a única carta do amado, com o perfume quase se esvaindo do papel, letras borradas das lágrimas que ambos derramaram naquele frágil pedaço de papel, cheio de promessas e saudades. Rosa, tão bela Rosa. Tive que partir, e você sabe minhas motivações. Deixo-lhe com um aperto no peito, beijos em tuas mãos e com dissabores na vida. Prometo-lhe notícias, em breve, da carta que precisas para deixar o país, e vir, finalmente, me encontrar. Ansiosamente, aguardo-te e sonho contigo todas as noites. Porém, a vida nos trópicos está me fazendo bem. Quase não se vê sinal das minhas tosses. Estou empregado, trabalhando na fábrica de alumínio. Moro com mais doi
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