Me permitir fugir do que é a realidade passada na cara, esfregada e cansada de me dizer que não. Que não fizesse, que não fugisse, que encarasse. Por demais inútil, continuei correndo atrás. Indo atrás do impossível, e me deixando embeber por algo incauto, inalcançável, incerto. Mas de que serve a vida se não há espaço para fantasia? Que serve esse corpo de alma e carne se não há lugar para o obscuro? Com um senso mais apurado do que gosto ou não, sinto-me mais difícil de apetecer pelo raso, pelo inculto, pelo pouco ou pelo menos. De tanto sentir e ser liberdade, acabou transformando-se em libertinagem. Queria voltar a conseguir manter tudo junto, manter a cabeça erguida. Mas mudou. Não por que quis, mas foi obrigada. Todas as suas crônicas foram resvalando pelo ralo, e sentiu-se impotente até para fazer o que fazia pra descarregar. Quando voltou a fazê-lo, tinha tanta coisa aprisionada, tanta coisa sua que precisava cuspir, que soltou, mas de uma forma verborrágica e confusa. E esse foi o tipo de pessoa que se tornou: do tipo verborrágica e confusa. Que foi forçada a desapegar, mas sente muita falta. Do amor que não jaz mais aqui, mas que foi pra algum outro lugar que pudesse fazê-lo feliz. E feliz era o que ela estava almejando ser. Foi pra outro lugar, e quem sabe, ser feliz.
Eu sobrevivo, eu sobrevivo! Polônia. Tempos difíceis, todas as pessoas consideradas indesejadas estavam indo embora para terras quentes, infestadas com o odor da novidade, do fervor da fuga. A saída sorrateira do país desencontrava amores, despistava amantes. Numa casa, não muito longe do centro de Varsóvia, uma mulher suspirava. Lia e relia a única carta do amado, com o perfume quase se esvaindo do papel, letras borradas das lágrimas que ambos derramaram naquele frágil pedaço de papel, cheio de promessas e saudades. Rosa, tão bela Rosa. Tive que partir, e você sabe minhas motivações. Deixo-lhe com um aperto no peito, beijos em tuas mãos e com dissabores na vida. Prometo-lhe notícias, em breve, da carta que precisas para deixar o país, e vir, finalmente, me encontrar. Ansiosamente, aguardo-te e sonho contigo todas as noites. Porém, a vida nos trópicos está me fazendo bem. Quase não se vê sinal das minhas tosses. Estou empregado, trabalhando na fábrica de alumínio. Moro com mais doi
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