Eu te avisei. Se meter comigo, para quê? Agora está pendurada, que nem as outras. Pobrezinha. Eu até tentei avisar, que estar comigo era jantar com o perigo. Numa cega segurança, guiada por um instinto cego como o gume da faca recém amolada que enfiei, inteira, no seu peito. Pobrezinha. Tudo tem que ter um fim, você diz. Interessante como você foi realmente brilhante na afirmação. Você teve um fim. Tentou até gritar. Estamos longe demais para isso, meu amor. Mas de você eu gostava. Gostava mesmo. Até cogitei procurar outra vítima. Arriscado demais. Para mim e para você, não é mesmo? Pena. Hoje vou sair, meu amor. Vou ver pessoas, te arranjar companhia, quem sabe? Você está aí, nesse gancho, imóvel, tão só. Tive que jogar as outras fora, estavam começando a me incomodar com aquele cheiro pungente de cadáver velho. Você entende, não é? Vou apagar as luzes agora, querida. Boa noite.
Eu sobrevivo, eu sobrevivo! Polônia. Tempos difíceis, todas as pessoas consideradas indesejadas estavam indo embora para terras quentes, infestadas com o odor da novidade, do fervor da fuga. A saída sorrateira do país desencontrava amores, despistava amantes. Numa casa, não muito longe do centro de Varsóvia, uma mulher suspirava. Lia e relia a única carta do amado, com o perfume quase se esvaindo do papel, letras borradas das lágrimas que ambos derramaram naquele frágil pedaço de papel, cheio de promessas e saudades. Rosa, tão bela Rosa. Tive que partir, e você sabe minhas motivações. Deixo-lhe com um aperto no peito, beijos em tuas mãos e com dissabores na vida. Prometo-lhe notícias, em breve, da carta que precisas para deixar o país, e vir, finalmente, me encontrar. Ansiosamente, aguardo-te e sonho contigo todas as noites. Porém, a vida nos trópicos está me fazendo bem. Quase não se vê sinal das minhas tosses. Estou empregado, trabalhando na fábrica de alumínio. Moro com mais doi
Que amor.
ResponderExcluir