O jantar está frio e ninguém veio. É engraçado como as pessoas andam sozinhas quase sempre e se mostram tão dependentes de alguém. O conceito de depêndencia também é engraçado. Assim como muitos conceitos. O de amor, de dor, ardor, vida e coisa e tal. O amor dói, mas doa o que doer, é muito pior viver sem ele. É como uma grande ferida aberta que nunca se fecha. A dor, tão cruel, complementa o amor. Amor dolorido, as vezes sem um porquê, as vezes sem rumo e sem os pés no chão. A dor coloca os pés dele no chão, na verdade, nas brasas. E queima. E acaba provocando o ardor. Talvez por alguns segundos, talvez por mais. Escondido por trás da ferida ou do esparadrapo, geralmente atrás do pudor. A vida descansa na cama, deixando-se levar. Espera que alguém a acorde e está pronta pra despertar. E tem a coisa e tal, que acaba sendo a mesma coisa que o tal e coisa. O jantar estava frio, e ninguém o comeu. Ficou a noite lá, pairando no ar, como palavras não ditas, pedras não atiradas e vidas imaculadas. Quando finalmente foi jogado fora, levou junto a ferida, a cama, as brasas e o esparadrapo, deixando algo insólito demais pra continuar pairando.
Eu sobrevivo, eu sobrevivo! Polônia. Tempos difíceis, todas as pessoas consideradas indesejadas estavam indo embora para terras quentes, infestadas com o odor da novidade, do fervor da fuga. A saída sorrateira do país desencontrava amores, despistava amantes. Numa casa, não muito longe do centro de Varsóvia, uma mulher suspirava. Lia e relia a única carta do amado, com o perfume quase se esvaindo do papel, letras borradas das lágrimas que ambos derramaram naquele frágil pedaço de papel, cheio de promessas e saudades. Rosa, tão bela Rosa. Tive que partir, e você sabe minhas motivações. Deixo-lhe com um aperto no peito, beijos em tuas mãos e com dissabores na vida. Prometo-lhe notícias, em breve, da carta que precisas para deixar o país, e vir, finalmente, me encontrar. Ansiosamente, aguardo-te e sonho contigo todas as noites. Porém, a vida nos trópicos está me fazendo bem. Quase não se vê sinal das minhas tosses. Estou empregado, trabalhando na fábrica de alumínio. Moro com mais doi
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