Pular para o conteúdo principal

Wonderful Tonight

Ontem, em um surto de raiva total e insana, a procura do quimono pra o judô, eu joguei todas as roupas do meu armário no chão. Achei o quimono, e na pressa pra sair de casa, larguei tudo como estava. Quando voltei, mais tarde, suada e nojenta, tomei um banho. E as roupas continuaram jogadas no chão. Antes de dormir, depois de um trabalho particularmente difícil de sociologia, catei as roupas do chão e as joguei de qualquer forma no armário, torcendo pra que eu não me sentisse incomodada pela manhã, quando meu cansaço fosse menor. Pela manhã, quando fui procurar meu uniforme, já atrasada pra o colégio, vi a bagunça que eu tinha deixado pra trás. Resolvi que arrumaria depois da escola. Cheguei em casa tão ensopada do banho de chuva que tomei, que não arrumei nada. Tirei a roupa que eu estava usando, tomei um banho, almocei e rumei de volta pra escola. Quando voltei pela segunda vez da escola, ignorei o armário e dormi. A noite, percebi que estava com uma das unhas pintadas descascando. Quando abri a porta do maldito armário, lá estavam as roupas, jogadas de qualquer jeito, me encarando. Resolvi arrumá-las. Cuidadosamente as tirei das prateleiras e as movi pra minha cama. Enquanto ia dobrando as roupas pra colocá-las de volta em seus devidos lugares, lembrei de situações nas quais as usei. O vestido vermelho que me faz sentir bem, e que usei na festa de um amigo. O short jeans já gasto, mas que é meu favorito. A blusa azul marinho que usei em uma manhã agradável no centro da cidade. A saia preta rodada que estava na minha mochila, e que eu gosto de usar sempre que possível. As minhas toneladas de blusas de banda, todas recortadas, e usadas em shows, noites em bares, festas, todos os lugares. Os sapatos de salto, escolhidos cuidadosamente para combinar com as festas que eu teria no momento. Os milhares vestidos esporte fino pras festas de 15 anos, que agora são parte de um passado relativamente distante. A blusa verde de listras, que eu usei naquela vez em Pipa. Então, ao som de Wonderful Tonight, do Eric Clapton, eu sentei na cama e chorei. Chorei de saudades. Chorei de solidão. Chorei de vontade. Chorei de tristeza. Chorei de felicidade. Chorei. Quando a música repetiu, e veio o Eric (me permitindo a intimidade de chamá-lo só pelo primeiro nome) dizer "And I say yes, you look wonderful tonight", chorei mais. Mas enxuguei as lágrimas, sorri pra mim mesma no espelho, levantei da cama, e fui pra cozinha. E ainda sim, eu estava maravilhosa hoje a noite.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Acha Que A Sua Indiferença Vai Acabar Comigo?

Eu sobrevivo, eu sobrevivo! Polônia. Tempos difíceis, todas as pessoas consideradas indesejadas estavam indo embora para terras quentes, infestadas com o odor da novidade, do fervor da fuga. A saída sorrateira do país desencontrava amores, despistava amantes. Numa casa, não muito longe do centro de Varsóvia, uma mulher suspirava. Lia e relia a única carta do amado, com o perfume quase se esvaindo do papel, letras borradas das lágrimas que ambos derramaram naquele frágil pedaço de papel, cheio de promessas e saudades. Rosa, tão bela Rosa. Tive que partir, e você sabe minhas motivações. Deixo-lhe com um aperto no peito, beijos em tuas mãos e com dissabores na vida. Prometo-lhe notícias, em breve, da carta que precisas para deixar o país, e vir, finalmente, me encontrar. Ansiosamente, aguardo-te e sonho contigo todas as noites. Porém, a vida nos trópicos está me fazendo bem. Quase não se vê sinal das minhas tosses. Estou empregado, trabalhando na fábrica de alumínio. Moro com mais doi

Ser gay ou não ser?

“So you say, It’s not okay to be gay?” Me diz uma coisa: por que não seria ok ser gay? Me diz o problema. Por que diabos seria errado? Desde quando amor é errado? Uma relação gay é uma relação de amor também. Eu estou realmente querendo saber. E não me venha com aquela bobagem moralista de que é pecado, nem de que “Eu não sou contra, mais eu não apoio.” Pra você não apoiar uma coisa, você certamente deve ter motivos, correto? Como você pode não ser contra mais não apoiar? Que sentido isso tem? Se você não tem nada contra, logicamente você deveria apoiar. Mas tudo o que eu ouço na aula de formação ético social são essas babaquices . É isso que elas são. Tremendas babaquices de uma sociedade mentalmente enrustida, falei. É errado por que a igreja diz? Bem, sinceramente, a igreja já esteve errada antes, vão folhear um livro da idade média, pelo amor de deus! Amor é amor de qualquer forma, de qualquer sexo, de qualquer porra de coisa. Jesus Cristo não pregava amor? Bem, isso é amor. Eu so

Agora Você Nem Me Nota

Depois de uma conturbada manhã no sofá, duas horas de aula nas férias, e muito resmungar, resolvi que estava na hora de ir pra casa de Flora. Antes do escurecer, consegui chegar. Depois de brincar com a Caty Perry (nome criativo pra uma gata mascarada), ficar no pottermore, comer mousse de maracujá (no caso eu, por que sou uma gorda e me orgulho), e atormentar a vida da Caty com o espirrador de água, fomos intimadas a nos arrumar com rapidez, por que a mãe de Flora estava chegando. Corremos, nos vestimos, e fomos capazes de nos arrumar em tempo. Ao chegar no bar (que por acaso se chamava Eletro Cana Rock), encontramos poucos conhecidos. A medida que as pessoas iam chegando, o barulho ia aumentando e mais gente conhecida aparecia (inclusive a banda que ia tocar). Margot e Flora estavam com fome, e eu, bem, eu estou sempre com fome. Fomos em um barzinho suspeito (depois de um interrogatório dirigido a Iuri sobre como ele conseguiu água), que tinha uma estante cheia de cachaça barata, coc